Episódio 23 – As missões jesuíticas e o povo Guenoa Minuano 29.12.24
Episódio 24 – As outras reduções jesuíticas na Província do Paraguai
Antonio, o título desse episódio é “As outras reduções jesuíticas na Província do Paraguai’. Qual é o motivo da escolha desse título?
Marisa, nós já vimos em episódios anteriores que o projeto reducional é anterior aos jesuítas e que, dentro do que conhecemos como trinta povos missioneiros ou reduções jesuítico-guarani, outros povos para além dos Guarani falantes estiveram nelas presentes. No entanto, antes de entrarmos especificamente nos povoados missioneiros dos Guarani, temos de considerar que os jesuítas da Província do Paraguai criaram povoados com outros povos indígenas no amplo território que formava aquela província. É sobre essa experiência missionária que nos deteremos nesse episódio.
Vamos dar uma recorrida, então, pelo espaço da Província Jesuítica do Paraguay para tratar do assunto?
Sem, dúvida! O primeiro grupo de reduções que destaco são aquelas fundadas pelos jesuítas em território pertencente à atual Bolívia, entre os Chiquito. Foram 11 os povoados criados entre 1691 e 1767. Uma vez que boa parte da estrutura daquelas reduções encontra-se preservada, ainda hoje é possível vivenciar o espaço reducional do passado de forma mais integral. Na mesma Bolívia, tenho também de salientar as missões realizadas com os Chiriguano, um grupo avá-guarani que se deslocou da região brasileiro-paraguaia nos séculos XVI e XVII e se instalou próximo aos Andes.
Já com relação ao Chile, tenho de dizer que aquele território esteve ligado à Província Jesuítica do Paraguai entre 1607 e 1624, quando passou a ser vice-província do Peru. Lá, inicialmente, o Padre Diego de Torres buscou empreender missões junto aos indígenas tanto em Arauco como nas ilhas de Chiloé. Realizando seus trabalhos a partir de fortes militares, no local não se chegou, talvez por isso, a implantar povoados nos moldes dos povoados dos Guarani. Ressalto que os missionários enfrentaram muita resistência no estabelecimento de missões naquele lugar. Inclusive, rebelando-se contra a nova moralidade instituída pelos jesuítas, os Mapuche mataram os missionários Martín de Aranda Valdívia, Horácio Vecchi e Diego de Montalbán, na região de Elicura em 1612.
Já na Região de Tucuman, Noroeste Argentino, os Jesuitas estabeleceram inicialmente missões volantes aos indígenas do Vale dos Calchaquí, onde viviam os povos Pulares, Chiquanas, Diaguitas, Calchaquíes, Lutintuos, Acampis, Paucipas, Quilmes, Tolombones, que falavam a língua Kaká. Para missionar entre esses povos, os jesuítas realizavam as entradas a partir das cidades espanholas, acompanhados de militares. Como durante mais de um século esse povos indígenas viveram em guerra constante contra os espanhóis, sendo assim o vale despovoado e seus moradores distribuídos entre as cidades espanholas, por conta dos constantes repartimientos dos indígenas entre os colonizadores que foram realizados, os jesuítas tiveram grande dificuldade para estabelecer núcleos indígenas permanente para além de missões volantes entre eles.
Já na região Chaquenha, uma vasta faixa da planície central da América do Sul, limitada a leste pelo sopé dos Andes, ao norte pela planície de Chiquitos, a leste pelos atuais Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e pelos rios Paraná-Paraguai e ao sul pelo rio Salado, existia um conjunto bastante grande de povos indígenas, muitos dos quais atacavam constantemente os povoados coloniais e dificultavam o deslocamento dos colonizadores. De forma sintética, o historiador Carlos Page dirá que as descrições dos primeiros conquistadores são tão contraditórias e confusas que é muito difícil estabelecer a identificação e localização de todas as nações que povoaram o Chaco. Muitos destes grupos étnicos refugiaram-se nas suas florestas impenetráveis para se protegerem da ameaça espanhola. Mas para se ter uma ideia geral da composição etnográfica da região podemos estabelecer a localização de três grandes grupos étnicos: Lule-Vilela, Guaicurú e Mataco-Mataguayo. O primeiro grupo, localizado no Chaco Ocidental, era a população mais antiga que ocupava a região. Os Isistiné, Tokistiné, Oristiné e Matará pertenciam aos Lules ou Tonocotés. Mais tarde chegaram os Guaicurú, que eram fundamentalmente os Toba, Abipon e Mocoví, mas também, e entre outros, os Pilagá, Mbayá e Payaguá que mostraram uma maior rejeição à vida reducional. Finalmente os Mataco-Mataguayo estabeleceram-se entre os rios Pilcomayo e Bermejo. A todos esses povos, os jesuítas direcionaram suas atividades missionárias e intentaram fundar povoados permanentes. Melhores resultados conseguiriam, entretanto, somente no século XVIII, pouco antes de sua expulsão da América.
Vamos falar especialmente dos Guaicuru?
Os Guaicuru, nome dado negativamente pelos Guarani a um conjunto de povos que compunham uma família linguística, ofereceram muita resistência à colonização. Por isso, as autoridades coloniais buscaram subjugá-los pela fé, já que não o conseguiam pelas armas, nas constantes guerras establecidas contra eles, quma vez que eram invencíveis nas águas e, depois que adotaram o cavalo, também pela terra. Foram várias as tentativas realizadas pelos jesuítas de estabelecer missões permanentes entre eles. Dentre os que se dedicaram a essa tarefa encontram-se os padres Vicente Grifi e Roque Gonzalez, no século XVII. Assim como em outras tentativas, os missionários tiveram grande dificuldade de permanecer entre os Guaicuru e as missões tiveram de ser interrompidas diversas vezes por conta da reação dos indígenas, os quais não abandonavam seu modo de ser guerreiro e a constante mobilidade, chegando inclusive a matar o padre Romero. Os povos Guaicuru, apesar de comerciarem com os colonizadores, mantiveram seu ethos guerreiro ao longo de todo o período, sendo considerado um dos grupos humanos que mais resistiram à colonização e ao estabelecimento de missões religiosas. Os jesuitas conseguiram estabelecer reduções mais permanetes eles entres, como dissemos, somente no século XVIII. Essa característica belicosa chegaria até próximo do presente, tanto que o Império Brasileiro somente consegui fazer as pazes com um de seus povos no século XIX, na Guerra contra o Paraguai, quando estes lutaram ao lado dos brasileiros sob a condição de receber a guarida de suas terras. Atualmente, um dos povos herdeiros dos antigos Guaicuru, em território brasileiro, é o povo Kadiwéu, localizado no Mato Grosso do Sul.
Espero que tenhas gostado do assunto tratado nesse episódio. Até o próximo. Aguyjevete. Obrigado.
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